quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Sobre o luto e a morte

Temos horror à morte e é até compreensível, posto que é a separação final, a derradeira. Parte de toda angústia humana tem a ver com separação e ela é a separação irrevogável. Mas uma coisa é certa: todos vamos, mais cedo ou mais tarde, nos deparar com ela – e não estou falando da nossa própria morte, a morte que se morre – falo da morte de entes queridos, a morte que se vive. Quanto mais vivermos, mais pessoas veremos morrer.

No tempo dos nossos avós, as pessoas morriam e eram veladas em casa, normalmente o caixão era colocado na sala da casa e velado por toda a noite, com choro, conversa, bebida e comida. As pessoas contavam casos da vida do morto, riam dos seus episódios hilários e choravam a sua partida. Só então o cortejo partia para o funeral. Hoje, morre-se mais nos hospitais e o velório praticamente não existe: no cemitério São João Batista, por exemplo, as capelas são fechadas às 22 horas por “motivo de segurança”. O morto fica lá sozinho, esperando os familiares voltarem para o enterro no dia seguinte (sem comentários).

No sétimo dia, os que são católicos celebram uma missa muito da impessoal, raramente alguém faz um discurso, toca uma música ou lê um poema em homenagem àquela vida que se foi. Aos que perderam uma pessoa amada, restam o silêncio, a solidão. Não é raro ouvir alguém falar de uma viúva ou um filho assim: “fulano tá ótimo, já até voltou a trabalhar”. Destituídos do ritual, perdemos o direito à celebração da pessoa que partiu, o direito ao luto. Não que eu ache que a vida não tenha que prosseguir – ela vai prosseguir – mas vai prosseguir melhor ainda se pudermos sentir o luto e sair dele. E para sentir o luto, precisamos poder falar sobre quem morreu, recordar histórias, rir e chorar, sentir o calor da acolhida de quem ainda está aqui, compartilhar a perda com outros que também amaram aquela pessoa. Assim, a morte tem o poder de unir os vivos.

Vai o luto e fica a saudade que volta e meia aparece precipitada pelo gosto de uma comida, por um cheiro, um sonho, uma lembrança. Nossos mortos estão vivos dentro dos nossos corações e das nossas memórias e só de fato morrerão de todo quando nós também tivermos partido. Eu sou a favor da volta do ritual, nem que seja um singelo almoço íntimo na saída do funeral... proponho uma festa (também íntima e singela) de sétimo dia.

6 comentários:

Unknown disse...

Concordo em gênero,número e grau! Quando eu morrer, espero que meus amigos saiam, tomem um grande porre e relembrem as histórias engraçadas que vivemos juntos. Nada me faria mais feliz (seja lá onde eu estiver)!

Vinicius Medeiros disse...

Adriana,

Sei muito bem o que te motivou a escrever esse post e, tenha certeza, concordo em gênero, grau e número contigo. Sabe, não derramei uma lágrima sequer desde que Dona Dulce, ou Dona Doce, como preferir, se foi. Não sou frio, sentirei sua falta, mas ela estará viva para sempre no meu coração. Lembrarei com alegria dos nossos jogos de buraco, da farofinha com ovos que ela me fazia e, principalmente, dos beijos e carinhos que ela me dava. Isso é o que fica, pois o corpo, a matéria, um dia tem que partir - não tem jeito.

Unknown disse...

concordo com tudo ...porque não celebrar a vida ...lembrar ...não pular fases ...não é a toa que os sabios criaram os rituais ...se despedir ,lembrando da vida ...

Anônimo disse...

Grande Adriana

Em algumas religiões esse ritual já existe. Na Inglaterra, onde morei, me lembro, certa feita, de comemorarmos o falecimento com um almoço e eles eram Anglicanos. Mas concordo com os pontos por você levantados, eu adoraria que depois de minha morte um almoço fosse realizado, até por que, eu estaria lá com certeza nessa confraternização...

Grande abraço

Luiz Guilherme de Beaurepaire

Adriana Pinheiro disse...

Pois é, os ingleses fazem isso, é muito bacana. Com discurso, vídeo, música, choro e riso... eles sabem se despedir. Não ficam perdidos, têm um ritual.

Anônimo disse...

Espero bem q quando sera eu a partir q meus amigos e familia façam festa e q comemorem a minha vida partilhada com
> eles, com certeza tembem estarei pensando neles.
> Lembro super bem da época de meus avos la na Roça quando faziamos um truc chamdo ladainha. Era assim mesmo, o morto
> la na sala e todos nos, bebendo, comemdo e rindo contando as hitorias da vida do morto. he he.
> Morbido sim, mas faz parte da vida. ( a morte)
> Bjs milllll!!!
> Ceiça Lopes